Mas que novela é essa de uma personagem só, né? Ridícula, não tem estória, não tem trama, não tem nada. Mas sou novela mexicana, daquelas bem bregas e dramáticas ao extremo. Nasci novela mexicana e morrerei novela mexicana.
Sou praticamente um "Canavial de não-paixões".
Proibíram a mim, novela mexicana, de praticar a quem quisesse, todas as ínfimas ações - e transgressões -, de que tenho posse. Como sempre não dou lucro algum aos meus produtores. Mas enfim.
Só me resta reeditar todo o roteiro e seguir em frente... Isso dá medo e é doloroso, aquelas personagens tão gêmeas, tão completas... É, tá, tchau pra elas. O novo roteiro implica mudanças drásticas, foda-se, mesmo assim manterei o palavreado chulo, é minha marca maior, talvez não a única, mas é a mais perceptível... O palavreado chulo, a falta de pudor, a sacanagem explícita citada e feita - epa -, a liberdade de expressão, os abandonos sem explicação, a raiva endemoniada, enraizada além dos poros, o chororô e a tristeza desmedidos, o raciocínio primeiro inapto, a frieza descomunal, a total falta de confiança e segurança. São tantas as marcas...
Contudo, de novela mexicana incorporo em borboleta. E o que há de tão surpreendente e magnífico em ser borboleta além de me metamorfosear? Voar pra bem longe, para onde não possam me ver? Não ter ninguém? Ser "livre"? Livre de que? O meu passado me persegue, o meu eu não me deixa em paz. Mas se borboletas não têm parceiras, então talvez eu seja mesmo uma borboleta. E talvez um dia eu realmente suma, voe para bem longe, bem longe, e não dê mais notícias, e nunca reproduza, e nunca seja feliz, essas coisas de borboleta amaldiçoada... Mas ainda não sei o que há de tão esplendorosamente sensacional em ser borboleta, até agora só me deu desgosto e mais insegurança.
É muito estranho a maneira como certas coisas tão pequenas me atingem de forma tão grande. E é aí que me deixo rolar... Nunca vou esquecer dessa conversa.
"Há muitas razões para duvidar e uma só para crer."
(Carlos Drummond de Andrade)